Sempre fui uma aluna um pouco acima da média estudando ou não, e mesmo não sendo a primeira da classe sempre tive um desempenho acima da média. Normalmente era quieta e observadora, tinha uma boa memória, e essas características facilitavam meus estudos de forma que não tinha que varar a noite estudando como algumas colegas mais desatentas.
Mas Geografia era um terror, aqueles mapas não entravam em minha cabeça e até hoje confesso minha falta de habilidade para lê-los. Meu senso de direção fica entre sofrível e péssimo, consegui uma vez me perder em Irapuru, que é um tisco de cidade, que não tem nem 10 quadras de circunferência. Pra dizer a verdade, consigo me perder até no quarteirão de casa, imagine o estrago se me botam um mapa na mão...
Pois era dia de prova de Geografia, minhas notas sempre beirando o vermelho e eu estava lá matutando com minhas apreensões durante o recreio quando vi um ajuntamento de cabeças loiras num canto do páteo. Muita cabeça loira junta dá problema - pensei. E fui lá ver do que se tratava.
As garotas estavam com uma coleçãozinha interessante de papéis e canetas, umas anotando dados enquanto outras febrilmente os recitavam.
- O que vocês estão fazendo? perguntei inocentemente, já sabendo de antemão que boa coisa não poderia ser.
- Cola - respondeu lacônica e sucintamente a Telma, a líder da turminha de desandadas.
- Como assim "cola"?
- A gente anota tudo o que vai cair na prova, anota na perna, em papéizinhos, no estojo, dentro da caneta... depois na hora da prova e gente copia e pronto!
Naquele momento fez-se a luz diante de mim! Nada mais do terror das notas baixas, nada mais das broncas e cortes de mesada! Aquilo pra mim pareceu o supra-sumo da praticidade e vinha de encontro às minhas mais profundas necessidades do momento. Passei o resto do recreio anotando dados febrilmente, ora na perna, nos braços, em pedaços de papel. E aos poucos ia aperfeiçoando técnicas "colativas", enfiando pequenos pedaços de papel nas dobras da saia, prendendo-os no anel... O sinal que anunciava o fim do recreio pôs termo à nossa expedição geográfica ao sub-mundo da desonestidade e partimos, confiantes, para o teste mensal.
Sentada diante da prova eu via minhas colegas em movimentos suspeitos e olhares lânguidos e disfarçados para seus apetrechos de auto-ajuda. Tentei também usar os meus, mas as mãos tremiam quando peguei o primeiro papel. Droga! Caiu no chão, tentei espichar o pé, alcancei-o e coloquei-o embaixo do sapato. Quem sabe a resposta estivesse em meu braço? Mas não havia jeito, a freira me olhava fixamente, talvez suspeitando de meus movimentos anteriores. Tentei permanecer calma e baixei a cabeça, decidi ignorá-la.
Fui levantando a saia aos poucos, tentando vislumbrar alguma coisa útil naquele emaranhado de frases desencontradas, aos poucos compilando dados que estavam rascunhados em minha pele. A freira abandonou seu posto atrás da mesa e começou a dirigir-se para o meu lugar. Frio no estômago. Tentei disfarçar e colocar a saia no lugar mas temi que o movimento despertasse sua atenção.
A freira vinha em passos lentos mas eficientes em minha direção, senti que um tremor tomava conta de todo meu corpo, os dentes começaram a bater uns nos outros, comecei a suar frio. Enquanto a freira passava por entre as carteiras não tirava os olhos de mim, que à essa altura já tremia mais que vara verde, já estava quase tendo um ataque de epilepsia...
A freira parou ao meu lado. Eu estava ligeiramente arqueada para a frente, a saia um tanto levantada, as pernas ligeiramente abertas para facilitar a leitura por entre elas. A freira deu-me um "croque' na cabeça e resmungou:
- Senta direito. Isso lá é jeito de uma menina sentar?
Virou as costas e voltou a seu lugar. Nas veias, o sangue começava a correr em seu ritmo normal novamente. As mãos lentamente conseguiam segurar a caneta e minha cabeça começava a funcionar de novo. Um suspiro de alívio saiu de meus lábios e endireitei-me na carteira. Olhei a prova à minha frente, mais da metade sem fazer. Nesse momento tomei uma firme decisão. Levantei-me, fui até a mesa e coloquei minha prova sobre ela. Depois saí da sala, aliviada.
Sabia que a nota não seria lá aquelas coisas, talvez eu perdesse a mesada por um mês, quem sabe... Havia muitas incertezas em minha mente nesse momento, mas de uma única coisa eu tinha certeza clara, plena, total: colas não eram para mim. Fosse qual fosse o resultado de meus testes e provas dali pra frente, eles seriam sempre o resultado que eu conseguira honestamente, essa vida de desonestidade decididamente não era para mim.
(zailda coirano)
Mas Geografia era um terror, aqueles mapas não entravam em minha cabeça e até hoje confesso minha falta de habilidade para lê-los. Meu senso de direção fica entre sofrível e péssimo, consegui uma vez me perder em Irapuru, que é um tisco de cidade, que não tem nem 10 quadras de circunferência. Pra dizer a verdade, consigo me perder até no quarteirão de casa, imagine o estrago se me botam um mapa na mão...
Pois era dia de prova de Geografia, minhas notas sempre beirando o vermelho e eu estava lá matutando com minhas apreensões durante o recreio quando vi um ajuntamento de cabeças loiras num canto do páteo. Muita cabeça loira junta dá problema - pensei. E fui lá ver do que se tratava.
As garotas estavam com uma coleçãozinha interessante de papéis e canetas, umas anotando dados enquanto outras febrilmente os recitavam.
- O que vocês estão fazendo? perguntei inocentemente, já sabendo de antemão que boa coisa não poderia ser.
- Cola - respondeu lacônica e sucintamente a Telma, a líder da turminha de desandadas.
- Como assim "cola"?
- A gente anota tudo o que vai cair na prova, anota na perna, em papéizinhos, no estojo, dentro da caneta... depois na hora da prova e gente copia e pronto!
Naquele momento fez-se a luz diante de mim! Nada mais do terror das notas baixas, nada mais das broncas e cortes de mesada! Aquilo pra mim pareceu o supra-sumo da praticidade e vinha de encontro às minhas mais profundas necessidades do momento. Passei o resto do recreio anotando dados febrilmente, ora na perna, nos braços, em pedaços de papel. E aos poucos ia aperfeiçoando técnicas "colativas", enfiando pequenos pedaços de papel nas dobras da saia, prendendo-os no anel... O sinal que anunciava o fim do recreio pôs termo à nossa expedição geográfica ao sub-mundo da desonestidade e partimos, confiantes, para o teste mensal.
Sentada diante da prova eu via minhas colegas em movimentos suspeitos e olhares lânguidos e disfarçados para seus apetrechos de auto-ajuda. Tentei também usar os meus, mas as mãos tremiam quando peguei o primeiro papel. Droga! Caiu no chão, tentei espichar o pé, alcancei-o e coloquei-o embaixo do sapato. Quem sabe a resposta estivesse em meu braço? Mas não havia jeito, a freira me olhava fixamente, talvez suspeitando de meus movimentos anteriores. Tentei permanecer calma e baixei a cabeça, decidi ignorá-la.
Fui levantando a saia aos poucos, tentando vislumbrar alguma coisa útil naquele emaranhado de frases desencontradas, aos poucos compilando dados que estavam rascunhados em minha pele. A freira abandonou seu posto atrás da mesa e começou a dirigir-se para o meu lugar. Frio no estômago. Tentei disfarçar e colocar a saia no lugar mas temi que o movimento despertasse sua atenção.
A freira vinha em passos lentos mas eficientes em minha direção, senti que um tremor tomava conta de todo meu corpo, os dentes começaram a bater uns nos outros, comecei a suar frio. Enquanto a freira passava por entre as carteiras não tirava os olhos de mim, que à essa altura já tremia mais que vara verde, já estava quase tendo um ataque de epilepsia...
A freira parou ao meu lado. Eu estava ligeiramente arqueada para a frente, a saia um tanto levantada, as pernas ligeiramente abertas para facilitar a leitura por entre elas. A freira deu-me um "croque' na cabeça e resmungou:
- Senta direito. Isso lá é jeito de uma menina sentar?
Virou as costas e voltou a seu lugar. Nas veias, o sangue começava a correr em seu ritmo normal novamente. As mãos lentamente conseguiam segurar a caneta e minha cabeça começava a funcionar de novo. Um suspiro de alívio saiu de meus lábios e endireitei-me na carteira. Olhei a prova à minha frente, mais da metade sem fazer. Nesse momento tomei uma firme decisão. Levantei-me, fui até a mesa e coloquei minha prova sobre ela. Depois saí da sala, aliviada.
Sabia que a nota não seria lá aquelas coisas, talvez eu perdesse a mesada por um mês, quem sabe... Havia muitas incertezas em minha mente nesse momento, mas de uma única coisa eu tinha certeza clara, plena, total: colas não eram para mim. Fosse qual fosse o resultado de meus testes e provas dali pra frente, eles seriam sempre o resultado que eu conseguira honestamente, essa vida de desonestidade decididamente não era para mim.
(zailda coirano)